quinta-feira, 20 de novembro de 2003

04.01 O equívoco dos meios de produção

Costuma vulgarmente considerar-se como característica do Capitalismo a propriedade privada dos meios de produção. Tal ideia é errónea pois a propriedade dos meios de produção era também privada durante o Feudalismo e o Esclavagismo.

O que é próprio do modo de produção Capitalista é os meios de produção serem usados como Capital, na genial definição de Marx, através do ciclo D-M-D’.
Se tal ciclo deixar de estar presente o problema da propriedade torna-se secundário desde que, em sectores estratégicos, sejam impedidos pelo Estado o condicionamento e a manipulação de interesses sociais vitais sob pretexto da propriedade.

Os meios de produção (fábricas, terras, etc.) são algumas das formas que assume a riqueza acumulada por determinados indivíduos na sociedade. Não está agora em causa como e porquê determinados indivíduos, e não outros, acumularam riqueza.

Tal como milhões de pessoas depositam o seu dinheiro nos bancos e desconhecem o uso que do seu dinheiro é feito, analogamente também podemos imaginar uma organização social em que os detentores de maquinaria ou de terras entregariam esses meios a entidades que lhes procurassem utilizadores e receberiam por eles um juro nos mesmos moldes em que o dinheiro dos depósitos é retribuído.

Uma tal retribuição poderia ter subjacentes justificações como:

- compensar a desvalorização ou depreciação
- premiar a poupança

Quer o dinheiro, quer os outros meios de produção, deixam de constituir capital quando vistos sob esta óptica. O capital só existe quando os meios de produção entram no processo produtivo para, através da exploração do trabalho alheio, saírem aumentados desse mesmo processo [28].

Assim é possível imaginar uma lógica socio-económica em que os detentores dos meios de produção, embora remunerados, nunca entrassem nos projectos enquanto proprietários e nunca tivessem, por essa razão, nem a autoridade para gerir, nem o poder de se apropriar das mais-valias que o trabalho, e só o trabalho, produz.

É chegada a hora de os movimentos de esquerda desviarem as atenções do problema da propriedade dos meios de produção para os problemas da distribuição das mais-valias geradas por todos os intervenientes em Projectos na sociedade, quer esses Projectos visem a produção de bens materiais de consumo quer consistam da manipulação e disponibilização de informação.
É muito importante valorizar diferentemente, por exemplo, a importância relativa dos meios de produção tradicionais ligados à era industrial, da importância dos meios de armazenamento e comunicação da informação que marcam a economia do Digitalismo.

Os meios de produção, se desligados do conhecimento, não têm qualquer hipótese de realizar o potencial que encerram.

Como mostraram as experiências saídas da revolução de 1917 a apropriação pelo Estado dos meios de produção não garante, de forma alguma, a superação do Capitalismo.

O que verdadeiramente conta é a justiça na distribuição do valor acrescentado pela aplicação do trabalho, ou seja, pelo conhecimento.

É preciso encontrar uma fórmula mais rigorosa para definir a superação do Capitalismo do que “a propriedade colectiva dos meios de produção”. É o que vamos tentar no próximo capítulo.

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