quinta-feira, 20 de novembro de 2003

05.01 Superar os anacronismos

A escolha feita por Marx ao referir o conceito de mais-valia [1] a um período determinado de tempo, o dia de trabalho, condicionou a maior parte dos anacronismos com que nos confrontamos.
Sendo a mais-valia segundo Marx a diferença entre o valor das mercadorias produzidas durante um dia e o valor do salário auferido pelo trabalhador no mesmo período isso implica a necessidade de:
1. arbitrar, no fim do dia, um valor para as mercadorias produzidas baseado no tempo de trabalho [1] empregue na sua produção, independentemente do seu “destino” posterior no mercado. E para se precaver das variações da produtividade que ocorrem em cada caso produtivo concreto, Marx foi forçado a introduzir o conceito abstracto de “tempo de trabalho socialmente necessário” [1] para a produção das mercadorias.
2. determinar o valor auferido pelo trabalhador num dia de trabalho que não estivesse dependente da variabilidade dos salários concretos, o que resultou na definição do salários como tendencialmente equivalentes ao valor abstracto dos “meios de vida necessários para a subsistência dos trabalhadores” [1].
Paralelamente surgiram também caracterizações e definições relativas às mercadorias, aos consumidores e ao mercado.
Passamos seguidamente a analisar cada um destes tópicos e as suas implicações na percepção do marxismo por parte dos trabalhadores actuais.


5.1.1 A mais-valia referida a um período determinado
A escolha de Marx ao referir a mais-valia a um período de tempo determinado, o dia, teve certamente a ver não só com o tipo de produção na sua época mas também com as práticas contabilísticas e os meios disponíveis para as realizar.
A prática hoje corrente da contabilidade por produto, em paralelo com a contabilidade por períodos de tempo, permite conclusões sobre o custeio e a rentabilidade de cada produto que não estariam certamente disponíveis no tempo de Marx.
A primeira grande consequência nefasta desta escolha foi perder-se a visão de conjunto sobre a vida económica útil do produto e o escamotear da análise da mais-valia do conjunto de actividades que ocorrem a montante e a jusante da produção propriamente dita. Baseado numa produção mecânica ainda muito simples, Marx passa ao lado do carácter multifacetado e distribuído da produção actual, em que a mercadoria final é o resultado de múltiplas fases, em locais por vezes muito distantes, em que os contributos de cada interveniente são fulcrais para o valor gerado pelos outros.
Mas o aspecto fulcral deste anacronismo reside na incapacidade para incluir na mais-valia as consequências futuras do trabalho aplicado nas mercadorias durante um determinado período de tempo.
No tempo de Marx, um tecelão tecia num dia X metros de tecido e pronto; X metros de tecido eram sempre X metros de tecido. Como já vimos, hoje um trabalhador produz algo, por exemplo um programa de computador, e nem ele nem o seu patrão sabem à partida quantas unidades acabarão por ser produzidas e vendidas de tal produto.
Como já explicámos será a aceitação pelo mercado que acabará por determinar se são feitas 500 ou 10.000 cópias a partir do produto obtido de “um dia de trabalho” do programador.
Assim, o valor do que foi produzido não é passível de ser determinado no fim da jornada de trabalho; e se se aplicar a formulação de Marx quanto à mais-valia, pode chegar-se a valores muito abaixo daqueles que verdadeiramente ocorrem.
Dificilmente um trabalhador considerará válido o cálculo da mais-valia com base no valor correspondente a um dia do seu trabalho quando a mercadoria produzida proporcionou enormes lucros, ao longo de anos consecutivos, ao seu patrão.
Por isso propomos:
que a mais-valia seja calculada não no fim de cada dia mas no fim do ciclo económico das mercadorias e tendo em conta os resultados económicos que produziram, de acordo com as fórmulas apresentadas no capítulo “Valor de troca baseado em conhecimento”.


5.1.2 O tempo de trabalho como fonte do valor
Em “O Capital” e em “Salário, preço e Lucro” nomeadamente, Marx parte da análise dos comportamentos na troca de mercadorias para deduzir a conclusão de que é o trabalho que está na base da formação do valor das mercadorias.
Tal conclusão é amplamente justificada mas o mesmo não se pode dizer da conclusão seguinte de que a medição do valor do trabalho se faz com base no tempo da sua duração.
Com efeito Marx não adianta qualquer justificação para tal, limitando-se a enunciar essa tese como se algo de evidente e incontestável se tratasse:
“Um valor de uso ou bem, portanto, apenas tem um valor por que nele está objectivado ou materializado trabalho humano em abstracto. Como medir, então, a magnitude do seu valor? Pelo quantum da “substância formadora de valor [wertbildenden]” nele contido, pelo quantum] de trabalho. A quantidade do trabalho mede-se ela própria pela sua duração no tempo, e o tempo de trabalho, por seu turno, possui como padrão de medida determinadas partes de tempo, como hora, dia, etc.” (O CAPITAL, Livro 1º, Tomo I, 1ª Secção, Cap. 1; trad. portuguesa, Ed. AVANTE, pag 49)
Como se pode ver esta passagem não parece oferecer a Marx a mínima dúvida ou necessidade de demonstração.
Seria bom que quantos defendem a preservação desta tese, contra as investidas da própria realidade, aceitassem humildemente que se trata de uma conclusão pouco fundamentada e muito menos científica.
Adicionalmente, como mostrámos no Paradoxo 1, Marx parece ter desprezado o “trabalho vivo” cuja duração não depende da quantidade produzida (concepção, engenharia, marketing); para Marx 2000 casacos implicam sempre o dobro do tempo de trabalho de 1000 casacos.
Por hipótese o designer que concebe a embalagem de um produto gasta 5 dias nesse trabalho; no fim de cada dia qual foi o valor que produziu ? É impossível saber, pois enquanto o seu trabalho não estiver concluído não será possível determinar quanto tempo gastou, e ainda não se sabe quantas unidades do produto virão a ser produzidas a partir da sua criação.
Claro que todos compreendemos que à época, num contexto em que o trabalho era essencialmente repetitivo e mecânico, Marx tenha chegado a estas conclusões; mas à luz das realidades da produção de hoje elas têm que ser postas em causa e em última análise substituídas.
Por isso propomos:
que em vez do tempo de trabalho se considere o conhecimento incorporado pelos trabalhadores durante o ciclo de produção das mercadorias que, como veremos mais adiante, é fulcral para o resultado económico que elas acabam realmente por obter no mercado (como explicado no capítulo “Valor de troca baseado em conhecimento”).


5.1.3 O “tempo de trabalho socialmente necessário”
Como já dissemos o conceito de “trabalho socialmente necessário” [1] foi introduzido por Marx para se precaver das variações da produtividade em cada caso concreto da produção. Ou seja por exemplo, um tecelão podia com determinadas máquinas produzir x metros de tecido em 3 horas e outro tecelão, com outras máquinas, produzir os mesmos x metros de tecido em apenas uma hora. Então o problema resolvia-se pelo cálculo de um tempo “médio” considerando o nível da tecnologia no conjunto da sociedade. Vejamos o que diz O CAPITAL:
“...o trabalho que forma a substância dos valores é trabalho humano igual, dispêndio da mesma força de trabalho humana. A força de trabalho conjunta da sociedade que se manifesta nos valores do mundo das mercadorias vale aqui como uma única força de trabalho humana, apesar de consistir em inúmeras forças de trabalho individuais. Cada uma destas forças de trabalho individuais é a mesma força de trabalho humana que as outras na medida em que possui o carácter de uma força de trabalho social média e actua como uma tal força de trabalho social média; portanto, na medida em que, na produção de uma mercadoria, também só precisa do tempo de trabalho médio necessário ou socialmente necessário. Tempo de trabalho socialmente necessário é tempo de trabalho requerido para produzir qualquer valor de uso nas condições de produção dadas, socialmente normais, e com o grau social médio de habilidade e intensidade do trabalho (O CAPITAL, Livro 1º, Tomo I, 1ª Secção, Cap. 1, trad. portuguesa, Ed. AVANTE, pag. 49)
Nesta definição surge também o conceito de força de trabalho [1] essencialmente para distinguir o que há de específico na prestação de cada trabalhador, da disponibilidade abstracta para desempenhar tarefas durante o tempo em que está ao serviço do seu patrão.
Quer o “tempo de trabalho socialmente necessário” quer o conceito de “força de trabalho” revelam-se profundamente anacrónicos no mundo de hoje e de difícil aceitação pelos trabalhadores do conhecimento.
Numa época em que o conhecimento de cada trabalhador é o instrumento mais precioso que ele possui, o único que no essencial lhe garante o emprego e o salário, e em que a capacidade de inovar, de fazer diferente da média, é a sua maior vantagem profissional, esta involuntária desvalorização do trabalho contida na abordagem de Marx é quase inaceitável.
A consciência, e o orgulho, que os trabalhadores hoje têm do papel fulcral que a sua prestação individual pode ter no “sucesso” de um produto são postos em causa por esta redução arbitrária a um abstracto denominador comum.
Um simples exemplo serve para demonstrar a importância do aspecto qualitativo do trabalho: dois frascos de detergente têm sem dúvida “tempos socialmente necessários” de produção idênticos no entanto a sua aceitação pelos consumidores pode ser completamente diferente no que toca às quantidades vendidas. Como veremos mais adiante numa época em que a transacção mais comum dos consumidores é escolher entre vários produtos similares, a qualidade (e não a quantidade) do trabalho é determinante para tal selecção.
O “tempo de trabalho socialmente necessário” é um conceito de aplicação problemática, ou mesmo impossível, num contexto de trabalho não-repetitivo (como por exemplo a campanha de marketing de um detergente), repleto de tarefas com carácter único ou que nunca foram anteriormente realizadas.
Ainda podemos imaginar, embora com dificuldade, o “tempo de trabalho socialmente necessário” para produzir um metro de tecido; mas ninguém se atreverá a tentá-lo relativamente a um programa de computador para resolver um problema que nunca foi tratado.
Por isso propomos:
em vez do “tempo socialmente necessário”, a avaliação que o mercado efectivamente realiza do valor do conhecimento incorporado nas mercadorias (como indicamos no capítulo “Valor de troca baseado em conhecimento).


5.1.4 Os “meios de vida necessários para a subsistência dos trabalhadores”
Para Marx, a força de trabalho [1] no contexto do capitalismo, é uma mercadoria cujo valor é determinado pelo tempo empregue na produção dos meios de vida necessários à sua manutenção e reprodução, ou seja, à preservação da sua capacidade para continuar a participar no processo produtivo nos moldes esperados:
“A força de trabalho, porém, só se realiza pela sua exteriorização, só se activa no trabalho. Pela sua activação - o trabalho - é despendido um determinado quantum de musculo humano, nervo, cérebro, etc., que tem de ser de novo substituído. Este dispêndio aumentado implica uma entrada aumentada. Se o proprietário da força de trabalho hoje trabalhou, tem amanhã de poder repetir o mesmo processo nas mesmas condições de força e saúde. A soma dos meios de vida tem, pois, de bastar para conservar o individuo que trabalha como individuo que trabalha no seu estado de vida normal. As próprias necessidades naturais como alimentação, vestuário, aquecimento, habitação, etc., são diversas segundo as peculiaridades climáticas e outras peculiaridades naturais de um país. Por outro lado, o âmbito das chamadas necessidades imprescindíveis, assim como a maneira da sua satisfação, são eles mesmos um produto histórico e dependem, portanto, em grande parte, do estádio de civilização de um país e entre outras coisas dependem também essencialmente das condições em que se formou a classe dos trabalhadores livres e, portanto, de com que hábitos e exigências de vida. Por oposição às outras mercadorias, a determinação de valor da força de trabalho contém, pois, um elemento histórico e moral. Para um determinado país, num determinado período, contudo, o volume médio dos meios de vida necessários está dado (O CAPITAL, Livro 1º, Tomo I, 2ª Secção, Cap. 4, trad. portuguesa, Ed. AVANTE, pag. 199)
É claro que nos dias de hoje o problema não está na “subsistência” física dos trabalhadores a não ser em regiões atrasadas que têm um peso diminuto para o cômputo global do sistema.
Nas situações típicas, quando se diz que o “ proprietário da força de trabalho se hoje trabalhou, tem amanhã de poder repetir o mesmo processo nas mesmas condições” o que está em causa é garantir o grau qualitativo de prestação dos trabalhadores.
Nas condições da produção actual, que consiste cada vez mais em manipulação da informação e produção de conhecimento, a prestação dos trabalhadores depende essencialmente da sua formação e capacidade para integrar e interpretar a informação, o que implica o acesso a uma complexa teia de objectos de índole tecnológica, científica e cultural.
Pode dizer-se que neste plano é virtualmente impossível estabelecer a quantidade e qualidade necessária de tais objectos e portanto de elaborar um “cabaz de compras”, como o que Marx compôs para os operários do seu tempo, que seja o suficiente para, por exemplo, um arquitecto produzir projectos de elevada qualidade.
Ora, segundo Marx, é para o valor desta espécie de “cabaz de compras” que os salários inexoravelmente tenderão:
“Poderia responder com uma generalização e dizer que, tal como com todas as outras mercadorias, também com o trabalho, o seu preço de mercado, a longo prazo, se adaptará ao seu valor; que, por conseguinte, apesar de todos os altos e baixos e faça o que fizer, o operário só receberá, em media, o valor do seu trabalho, que se resolve no valor da sua força de trabalho, o qual é determinado pelo valor dos meios de subsistência requeridos para o seu sustento e reprodução, o qual valor dos meios de subsistência é finalmente regulado pela quantidade de trabalho necessário para os produzir (Salário, Preço e Lucro, trad. portuguesa, Ed. AVANTE, 1983, pag.. 65-67)”.
Na visão de Marx está também implícita a ideia da disponibilidade ilimitada de trabalhadores caracterizados por grande uniformidade. Marx limita-se a distinguir dois tipos de trabalho, trabalho social médio simples e trabalho complexo:
“Já antes foi notado que para o processo de valorização é completamente indiferente se o trabalho apropriado pelo capitalista é trabalho social médio simples ou trabalho complexo, trabalho de mais elevado peso específico. O trabalho que, face ao trabalho social médio, passa por trabalho superior e mais complexo é a exteriorização de uma força de trabalho em que entram custos de formação mais elevados cuja produção custa mais tempo de trabalho e que, portanto, tem um valor mais elevado do que a força de trabalho simples. Se o valor desta força é mais elevado, então também ela se exterioriza em trabalho mais elevado e objectiva-se, portanto, nos mesmos espaços de tempo, em valores relativamente mais elevados. Qualquer que seja a diferença de grau entre o trabalho de fiação e o trabalho de joalharia, a porção de trabalho pela qual o operário joalheiro apenas repõe o valor da sua própria força de trabalho não se diferencia qualitativamente, de modo algum, da porção suplementar de trabalho pela qual ele cria mais-valia. Tal como dantes, a mais-valia só surge por um excesso quantitativo de trabalho, pela duração prolongada do mesmo processo de trabalho: num caso, processo de produção de fio, no outro caso, processo de produção de jóias.
Por outro lado, em qualquer processo de formação de valor, o trabalho superior tem sempre de ser reduzido a trabalho social médio, p. ex., um dia de trabalho mais elevado a x dias de trabalho simples. Assim se poupa uma operação supérflua e se simplifica a análise pela admissão de que o operário, empregue pelo capital, realiza trabalho social médio simples.
....
A diferença entre trabalho superior e trabalho simples, “skilled” e “unskilled” repousa, em parte, sobre meras ilusões ou, pelo menos, sobre diferenças que de há muito deixaram de ser reais e apenas persistem na convenção tradicional, em parte, sobre a situação mais desesperada de certas camadas da classe operária que, menos do que a outras, lhes permite obter por ameaças o valor da sua força de trabalho. Circunstâncias casuais desempenham aí um papel tão grande que as mesmas espécies de trabalho mudam de lugar. Onde, p. ex., a substância física da classe operária se encontra enfraquecida e relativamente esgotada, como em todos os países de produção capitalista desenvolvida, em geral trabalhos brutais que exigem muita força muscular, convertem-se em trabalhos superiores, relativamente a trabalhos muito mais delicados que descem ao nível do trabalho simples, como, p. ex., o trabalho de um “bricklayer” (pedreiro) em Inglaterra que ocupa um nível muito mais elevado do que a de um tecedor de damasco. Por outro lado o trabalho de um “fustian cutter” (cortador de algodão) — embora custe muito esforço físico e seja, além do mais, muito pouco saudável — figura como trabalho “simples”. Alias, não devemos pensar que o “skilled labour” ocupe volume quantitativamente significativo no trabalho nacional. Laing calcula que, Inglaterra (e no País de Gales), a existência de mais de 11 milhões de pessoas repousa sobre trabalho simples. Descontando um milhão de aristocratas e um milhão e meio de indigentes, vagabundos, delinquentes, prostitutas, etc., dos 18 milhões do número de habitantes, ao tempo do seu escrito, sobram para a classe média 4 650 000, incluindo os que vivem de pequenos rendimentos ( funcionários, escritores, artistas, mestres-escola, etc). Para chegar a estes 4 2/3 milhões, ele conta como parte trabalhadora da classe media, fora os banqueiros, etc., todos os “operários fabris” mais bem remunerados! Nem sequer os “bricklayers” faltam entre os “trabalhadores potenciados”. Ficam-lhe, pois, os ditos 11 milhões. (S. Laing, National Distress, etc., London, 1844, [ 49-52 pag.]) “A grande classe que nada tem a dar por comida senão trabalho ordinário é a grande massa do povo.” (O CAPITAL, Livro 1º, Tomo I, 3ª Secção, Cap. 5, trad. portuguesa, Ed. AVANTE, pag. 227-228 ).
Desta citação de Marx pode concluir-se que ele via os trabalhadores no Capitalismo como uma grande massa indiferenciada cuja força podia ser valorizada em trabalho simples ou superior conforme a lei da oferta e da procura e os sucessos da luta de classes.
As próprias máquinas mecânicas, que na altura pareciam destinadas a proliferar eternamente, acabariam por transformar todos numa massa uniforme de trabalhadores.
Por aqui se pode ver quão longe estava o mundo de Marx do mundo actual com a sua enorme diversidade de profissões, de especializações e de saberes.
As citações acima apresentadas são só por si suficientes para afastar do marxismo qualquer trabalhador do conhecimento.
Numa época em que a selecção de pessoal se tornou uma técnica altamente especializada, com recurso a sofisticadas metodologias incidindo na avaliação da preparação, das atitudes e motivações, dos comportamentos e potenciais, e na qual as empresas investem somas avultadas; numa época em que encontrar bons gestores, ou técnicos de sistemas ou especialistas comerciais, ou até operários de certas categorias, leva as empresas a propor condições remuneratórias extremamente elevadas; a lógica implícita na visão de Marx expõe-se inexoravelmente ao ridículo.
Como Marx não merece isso, é aos marxistas que compete rever e substituir tal visão; e é por isso que contrapômos:
que os salários são hoje determinados pelo potencial de conhecimento que cada trabalhador está em condições de incorporar nas mercadorias e pela raridade de tais recursos humanos no mercado de trabalho.

5.1.5 As mercadorias e os comportamentos dos consumidores
Ao longo de muitas páginas de O CAPITAL, Marx usa repetidamente o exemplo da troca de 40 côvados de tecido de linho por um casaco para ilustrar as suas teses.
Tal exemplo é bem um sintoma da proximidade da sociedade da sua época relativamente à produção artesanal, já que indicia situações em que alguém produzira uma peça de tecido pelas suas próprias mãos e procurava no mercado trocá-la por um produto mais elaborado, eventualmente com origem industrial.
Uma situação deste tipo parecerá certamente bizarra a qualquer trabalhador da nossa época e pode levar a encarar as teses de Marx como algo que nada tem a ver com os problemas actuais, pois o que realmente ocorre hoje é chegar-se ao mercado com dinheiro para trocar por mercadorias.
Como se tal não bastasse, Marx passa completamente ao lado daquilo que é a transacção mais comum para os consumidores de hoje; seleccionar um entre vários produtos equivalentes. Por cada produto que se decide adquirir é-se confrontado com dezenas, ou até centenas, de hipóteses ou variantes.
Para Marx um casaco é um casaco, ponto final. Assim é afirmado em O CAPITAL, Livro 1º, Tomo I, 1ª Secção, Cap. 1, trad. portuguesa, Ed, AVANTE, pag. 53:
“Um casaco não se troca por um casaco, um valor de uso não se troca por esse mesmo valor de uso”

O valor de uso é tomado como inerente à mercadoria; como se um frigorífico tivesse o mesmo valor de uso nos trópicos e no Pólo Norte.
A questão das preferências dos consumidores e do seu fundamento, é demasiado importante para se poder varrê-la para debaixo do tapete como os marxistas têm feito. É das escolhas dos consumidores que resultam os lucros ou os prejuízos das empresas.
É por isso que insistimos:
no papel do conhecimento incorporado para a formação do valor das mercadorias e, dito de outra forma, para a sua aceitação pelo mercado.

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